Visita presidencial pautou as redes sociais e atraiu atenção para a tragédia vivida pelos indígenas
Redação
Brasil de Fato
A tragédia humanitária vivida pelos indígenas ganhou atenção pública nos últimos dias, em especial após a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Terra Indígena (TI) Yanomami, em Roraima. Ele foi acompanhado pelos ministros do Desenvolvimento Social (Wellington Dias), da Saúde (Nísia Trindade) e dos Povos Indígenas (Sonia Guajajara), marcando uma mudança drástica em relação ao seu antecessor na forma como o governo federal pretende lidar com o garimpo ilegal em terras indígenas e suas repercussões.
“Não vai mais existir garimpo ilegal. Eu sei das dificuldades de tirar o garimpo ilegal. Sei que já se tentou e eles voltam. Mas nós vamos tirar”, disse Lula após visita a um hospital indígena e à Casa de Saúde Indígena em Boa Vista, capital de Roraima, neste sábado (21).
“Se alguém me contasse que, aqui em Roraima, tinham pessoas sendo tratadas da forma desumana que eu vi o povo Yanomami sendo tratado, eu não acreditaria. Não podemos entender um país que tem as condições que têm o Brasil deixar os nossos indígenas abandonados como eles estão aqui”, afirmou o presidente.
O mesmo foi registrado em relação ao tema aborto. De acordo com o pesquisador, “foram 1.5x mais menções aos Yanomamis em apenas 24h do que sobre o termo aborto ao longo da última semana. Aqui, vale ressaltar o intenso engajamento de atores bolsonaristas que tentaram – em vão – pautar o governo”.
A extrema-direita até tentou associar a condição dos indígenas Yanomami a uma suposta “farsa da esquerda”, como o próprio Bolsonaro. Mas a tentativa foi um fracasso diante das imagens estarrecedoras de desnutrição infantil, insegurança alimentar e abandono.
Estado de emergência
Na sexta-feira (20), o Ministério da Saúde decretou estado de emergência para “planejar, organizar, coordenar e controlar as medidas a serem empregadas” a fim de reverter o quadro de desassistência instalado na TI Yanomami.
Deve ser realizado “o acionamento de equipes de saúde, incluindo a contratação temporária de profissionais” e a “aquisição de bens e a contratação de serviços necessários para a atuação” na emergência.
Também foi instalado o Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento à Desassistência Sanitária das Populações em Território Yanomami “para dar conta do problema de desnutrição, fome, saúde, muito grave nessa região”, segundo o ministro Wellington Dias. O comitê terá duração de 90 dias e suporte das Forças Armadas e da Funai.
Garimpo ilegal
Nos últimos anos, a situação dos indígenas Yanomami se agravou expressivamente. Segundo o Ministério da Saúde, “casos de desnutrição e insegurança alimentar, principalmente entre as mais de 5 mil crianças da região, foram registrados. Profissionais de saúde relatam falta de segurança e vulnerabilidade para continuar os atendimentos, dificultando ainda mais a assistência médica aos indígenas”.
Uma das principais causas foi a conivência do governo do ex-presidente Bolsonaro em relação ao avanço do garimpo ilegal na região. De acordo com Ivo Cípio Aureliano, indígena Macuxi e assessor jurídico do Conselho Indígena de Roraima (CIR), “todos os garimpos existentes em Roraima são ilegais e estão localizados dentro das terras indígenas. A promessa de legalização dessa atividade por parte do governo Bolsonaro, por meio do Projeto de Lei 191/2021, que está no Congresso Nacional, estimulou as invasões e aumentou
De acordo com um levantamento do Conselho, apenas na Terra Indígena Raposa Serra do Sol (TI RSS), também situada em Roraima, estima-se que existiam, em 2021, dois mil garimpeiros. Na TI Yanomami, as estimativas sobem para 20 mil garimpeiros.
“Em uma das regiões na TI RSS, a região Raposa, surgiu um ponto de garimpo (Garimpo do Atola ou Tarame), em 2018. Vários garimpeiros chegaram nas comunidades próximas Raposa I e Raposa II, principalmente na comunidade Napoleão, e começaram a cooptar as lideranças para os apoiarem com a promessa de que os indígenas receberiam uma porcentagem”, afirma Aureliano.
O impacto é direto nas comunidades indígenas. “Hoje tem várias máquinas chamadas de ‘moinho’ instaladas nesse garimpo para triturar as pedras para extrair o ouro. Depois lavam o material triturado e despejam os resíduos, inclusive o mercúrio, nos igarapés e lagos que estão ali próximos”, diz Aureliano.
Ainda em 2020, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) determinou a reativação de Bases de Proteção Etnoambiental (BAPEs) na Terra Indígena (TI) Yanomami e medidas de fiscalização e repressão ao garimpo ilegal.
A inércia do governo federal “evidencia necessária atenção redobrada para evitar a disseminação de epidemias virais e outras moléstias decorrentes da contaminação de rios e fauna com mercúrio, (…) situação que se agrava pelo atual contexto de pandemia pelo qual passa o país”, afirmou a desembargadora federal Daniele Maranhão na ocasião.
::Garimpo gera problemas sanitários, ambientais e culturais em terras indígenas::
Também ainda em 2020, o Instituto Socioambiental (ISA) indicou que a degradação mensal do garimpo na terra indígena Yanomami cresceu expressivamente em junho daquele ano: 179% em relação ao mês anterior. Naquele mês foram 109 hectares degradados, diante 39,1 hectares destruídos no mês anterior.