A CPMI do Golpe marcou para a próxima terça-feira (4) o depoimento do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro. Certamente, a maior parte das perguntas que os deputados e senadores farão ao militar será sobre o conteúdo encontrado pela Polícia Federal em seu celular.
O aparelho chegou às mãos da PF após Cid ser preso em 3 de maio, acusado de fraudar cartões de vacinação contra a Covid para ele mesmo, sua esposa, Bolsonaro e a filha do ex-presidente. No telefone, porém, os policiais encontraram provas de que Cid e outras pessoas muito próximas de Bolsonaro planejaram, após as eleições de 2022, um golpe de Estado para impedir a posse de Lula.
Veja a seguir um resumo de tudo que a Polícia Federal achou no celular de Mauro Cid:
Decreto de Estado de Sítio e de GLO
Um dos documentos encontrados pela PF é o modelo de um decreto de Estado de Sítio e de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) que seria assinado por Bolsonaro para interromper o processo democrático no Brasil.
Após acusar o Supremo Tribunal Federal (STF) de agir de forma inconstitucional e fazer uma análise completamente distorcida da Constituição, a minuta se encerra da seguinte forma: “Diante de todo o exposto (…) declaro o Estado de Sítio; e, como ato contínuo, decreto Operação de Garantia da Lei e da Ordem”.
É importante ressaltar: a decretação de Estado de Sítio suspenderia temporariamente a atuação do Congresso e do STF. E a GLO acionaria as Forças Armadas para agir conforme as ordens de Bolsonaro. Não há dúvidas, portanto, que se trata de um documento escrito com a intenção de se praticar um golpe de Estado no país.
Essa minuta golpista descrita pela PF no relatório é diferente do documento encontrado na casa de Anderson Torres, o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro que se tornou, depois, secretário de Segurança do DF. A PF investiga se se trata de documentos complementares, que fariam parte de um mesmo plano.
O documento “Forças Armadas como poder moderador”
Além da minuta de decreto golpista, o celular de Mauro Cid guardava também um documento que descreve oito etapas para a execução de um golpe para anular as eleições e impedir a posse de Lula, intitulado “Forças Armadas como poder moderador”.
As etapas descritas são: nomeação de um interventor; prazo para restabelecimento da ordem constitucional; Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal sob comando do interventor; suspensão de atos do Poder Judiciário e afastamento de magistrados; abertura de inquérito sobre magistrados; autorização para interventor suspender outros atos considerados inconstitucionais; substituição dos ministros do TSE; e realização de novas eleições.
O título do documento é claramente uma referência à tese absurda propagada pelo jurista conservador Ives Gandra Martins, espécie de mentor teórico do golpismo bolsonarista que, durante anos, afirmou que a Constituição preveria a possibilidade de as Forças Armadas agirem como poder moderador (leia mais abaixo).
Conversas com Jean Lawand
Autor das mais desesperadas mensagens clamando pela concretização do golpe, o então subchefe do Estado Maior do Exército, coronel Jean Lawand Junior, aparece em conversas com Cid defendendo claramente que Bolsonaro acione o Exército e dê um golpe.
“Cidão, pelo amor de Deus, cara. Ele [Bolsonaro] dê a ordem que o povo tá com ele, cara. Se os caras não cumprir, o problema é deles. Acaba o Exército Brasileiro se esses cara não cumprir a ordem do, do Comandante Supremo. Como é que eu vou aceitar uma ordem de um General, que não recebeu, que não aceitou a ordem do Comandante. Pelo amor de Deus, Cidão. Pelo amor de Deus, faz alguma coisa, cara. Convence ele a fazer”, pediu Lawand em um dos áudios enviados dia 30 de novembro a Mauro Cid, em 30 de novembro de 2022.
Mauro Cid, então, revelou dificuldades em executar o plano proposto por Lawand, não porque fosse antidemocrático, mas por Bolsonaro ter dúvidas de que o Alto Comando do Exército o apoiaria: “O PR (presidente da República) não pode dar uma ordem se ele não confia no ACE (Alto-Comando do Exército)”.
Lawand insistiu no golpe por quase um mês e só jogou a toalha em 22 de dezembro: “Soube agora que não vai sair nada. Decepção, irmão”.
Ailton Barros e Élcio Franco